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GRANDES ESCRITORES PARA PEQUENOS LEITORES

Cecília Meireles: uma poetisa para todas as idades

Mercedes Fernandes
 
 
 
Cecília Meireles é nossa homenageada da vez nesta nossa Seção do Blog. Em minha opinião, a escritora é uma das maiores poetisas em língua portuguesa.
 
 

 

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Estamos comemorando cinquenta e um anos de sua ausência terrena e sem dúvida podemos dizer que Cecília Meireles deixou uma grande lacuna literária.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

 

Cecília transitou em várias frentes, como jornalista, educadora e cronista, mas solidificou sua carreira de escritora com uma inclinação maior para a poesia, e ensaios literários desde muito jovem. Perdeu seus pais quando ainda muito pequena, e criada pela avó, passou a viver em um mundo próprio convivendo desde cedo com os sentimentos de perda e solidão. Neste processo deixou emergir uma mente criativa e poética que a fez ir em busca de vários processos de aprendizagem artística tais como música, dramaturgia cênica e contribuições literárias em programas de rádio. Além da verve de educadora e professora que a aproximou sobre maneira do universo infantil.

 

Sua obra infantil mais importante foi reunida em um livro publicado em 1964, e é em minha opinião, uma obra prima de construção poética e significante na alma infantil tocando não somente crianças como também jovens e adultos. “Ou isto ou aquilo” reúne poesias sensíveis ao mundo da criança, mas a meu ver é uma poética para todas as idades. Sua importância foi além dos escritos literários, pois comprometida com a educação como projeto de vida sócio- cultural, foi quem fundou no ano de 1934 a primeira Biblioteca infantil, no pavilhão Mourisco no bairro de Botafogo, no Rio de Janeiro onde funcionou por quatro anos.

Veio a tornar-se uma grande pesquisadora da cultura folclórica popular nacional saindo pelo país e exterior divulgando a literatura brasileira, com suas publicações e também através de programas de rádio e da dramaturgia teatral.

A obra de Cecília Meireles é vasta, e destaco aqui “o Romanceiro da Inconfidência”, escrito em 1940, porém publicado em 1953, como uma saga histórica literária que resgata um conceito de polifonia na Literatura. Através de uma obra poética a escritora revê o importante acontecimento da História brasileira da Inconfidência Mineira ocorrida no séc. XVIII, com extremo rigor histórico e emocional. Segundo pesquisadores , Cecília resgata uma historiografia do ponto de vista da derrota, da revolução pela independência. Neste sentido ao descrever uma saga revolucionária, ela não descreve uma epopeia ufanista. A autora busca uma reflexão sobre a busca do homem pela ambição, poder e a morte. 

“Ou isto ou Aquilo”, a obra e a poesia

Cecília publicou inúmeras obras sendo que “Ou isto ou Aquilo” foi a sua obra reconhecidamente maior no campo da literatura infantil. Além da Poesia magnifica que dá título ao livro, em seu interior mais de 50 poemas encantam gerações que tiveram a sorte de conhecer sua vasta obra. Em 1969, o livro foi reeditado incluindo novas poesias. A obra foi publicada por editoras variadas. Ao buscar algumas edições tive acesso a várias publicações, e é importante ressaltar a importância de alguns ilustradores que enriqueceram a obra de Cecília entre as quais destaco: Maria Bonomi na primeira edição; Rosa Frisoni em uma edição de 1969; Eleonora Affonso em uma edição de 1980; Thaís Linhares, Fernanda Correia Dias, Beatriz Berman e as ilustrações de Odilon Moraes, pela ed. Global em 2012.

Ao pesquisar o universo infantil de Cecília consta que ela escreveu uma obra de caráter mais privado e pouco conhecido na categoria infantojuvenil, que intitulou “Olhinhos de Gato.” Segundo relatos, a obra versa sobre a memória da menina Cecília, após a perda da mãe Matilde e a convivência com sua avó Jacinta e suas primeiras e sensíveis emoções que mais tarde se tornaram pura Literatura.

A obra “Ou isto ou Aquilo”

Este livro marcou profundamente a minha infância, pois minha mãe costumava pautar meu comportamento pela poética da grande escritora. Fez-me recitar vários versos e por vezes recitava para mim, qual seja, se eu fazia malcriações, recitava a Moda da “Menina Trombuda”; se eu tinha dúvidas ou me sentia insegura recitava “Ou isto ou aquilo”, se me mostrava irascível ela me recitava “O sonho e a fronha” e “Sonhos de Menina”.  Mas a minha imensa alegria é um poema que recito até hoje: “As Meninas”, que marcou profundamente a minha infância.

Fica em minha memória a saudade de folhear o livro, pois tenho um exemplar até hoje já tão gasto de tanto manusear suas páginas. Outras edições foram sendo reeditadas, mas a eterna saudade era misturar as poesias de Cecília com minhas fantasias de criança e de mulher adulta.

“Ou Isto ou Aquilo” ganhou o Premio da primeira bienal de S.Paulo como melhor livro, com ilustrações da artista plástica Maria Bonomi.

As adaptações da Obra “Ou isto ou Aquilo”

Nos anos oitenta, assisti a uma peça teatral magistral adaptada de sua obra Ou isto ou Aquilo. Foi montada pelo grupo Hombu, grupo de grandes criações e adaptações criativas de textos literários.

Aqui relato a experiência deste grupo teatral em suas próprias palavras:

 

OU ISTO OU AQUILO

adaptação da poesia de Cecília Meireles

Brincando com a Sonoridade

Em plena era da tecnologia, com videogames em 3D, enciclopédias e dicionários em CD-ROM, onde até as escolas mais tradicionais já convivem em seu dia-a-dia, com Pentiuns, Modens e Internet, o Grupo Hombu vem mostrar, com seus 20 anos de teatro, que é possível aprender, vivenciar e se divertir sem toda essa avassaladora (inevitável) tecnologia.

Assim surgiu Ou Isto ou Aquilo, uma grande “brincadeira” cênica, baseada nas doces poesias de Cecília Meireles e embalada por uma trilha sonora (executada ao vivo), que interage os atores com o público de forma suave e lúdica, atingindo assim uma vasta faixa etária.

Bola-de-gude, pião, toda, amarelinha e esconde-esconde, são apenas algumas brincadeiras resgatadas pelo Hombu, neste espetáculo, que substituem a tecnologia pela sonoridade poética dos versos de Jogo de Bola, A Lua é do Raul, O Último Andar, O Vestido de Laura, entre 24 outros poemas selecionados do belo livro de Cecília Meireles, do qual também tiramos o título.

Com Ou Isto ou Aquilo procuramos mostrar ainda a pureza dos sentimentos da infância, tão essenciais para a construção de um ser humano. Evocamos temas como a amizade, coletividade, a alegria do brincar, a facilidade do imaginar e sonhar acordado e, por que não, a descoberta do amor? Tudo isso vem através das lembranças de Marina e Mariana, As Duas Velhinhas, da poesia de Cecília Meireles.

Ou Isto ou Aquilo é um espetáculo realizado de forma ágil e lúdica com músicas tocadas e cantadas ao vivo.

Fonte: https://cbtij.org.br/1997-ou-isto-ou-aquilo-direcao-criacao-coletiva

Fotos de divulgação da peça 

  

Eu assisti a esta peça muitas vezes, na época fazia teatro e tive a chance de conhecer alguns membros da equipe inicial deste grupo: Silvia Aderne, Beto Coimbra, Sergio Fidalgo, Regina Linhares. A emoção que esta peça me causou estava muito além da experiência teatral que na época vivia intensamente. O que descobri foi que a emoção vinha do texto, das palavras contidas na poética de Cecília cuja bela encenação do grupo, potencializava a riqueza do espetáculo.

 

A poesia

Ou Isto ou Aquilo

 

Ou se tem chuva e não se tem sol,

ou se tem sol e não se tem chuva!

 

Ou se calça a luva e não se põe o anel,

ou se põe o anel e não se calça a luva!

 

Quem sobe nos ares não fica no chão,

quem fica no chão não sobe nos ares.

 

É uma grande pena que não se possa

estar ao mesmo tempo nos dois lugares!

 

Ou guardo o dinheiro e não compro o doce,

ou compro o doce e gasto o dinheiro.

 

Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo...

e vivo escolhendo o dia inteiro!

 

Não sei se brinco, não sei se estudo,

se saio correndo ou fico tranqüilo.

 

Mas não consegui entender ainda

qual é melhor: se é isto ou aquilo.

 

 

Assista também: Vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=icsLaAntvSI

Programa De cá pra Lá, com entrevistas de Ancelmo Góes e Vera Barroso com diversos autores sobre Cecília, entre eles, a escritora Laura Sandroni, TB Brasil, 2011.

 

            

dezembro/2015